Tese (Livre Docência)
Consumo contemporâneo de drogas e juventude: a construção do objeto na perspectiva da saúde coletiva
Autor(a):
Soares, Cássia Baldini
Ano de publicação:
2007
Unidade USP:
Escola de Enfermagem [EE]
Assuntos:
drogas de abuso; jovens; políticas públicas; enfermagem em saúde pública; valores sociais
Palavras-chave do autor:
drogas de abuso;juventude;políticas públicas;saúde coletiva;valores sociais
Resumo:
Este trabalho trata da construção do objeto consumo de drogas pela juventude, demonstrado a partir da análise crítica de estudos por nós produzidos, e que tomam como referência os fundamentos do campo da Saúde Coletiva e da Enfermagem em Saúde Coletiva, num movimento que partiu da avaliação de programas de prevenção do uso de drogas, amadureceu com a inscrição progressiva do conceito de necessidades de saúde e, finalmente, com a apropriação do conceito de valor para realizar o recorte do objeto de estudo e de intervenção. Tratamos dos eixos teóricos de nossa produção, levando em conta as diferentes maneiras sob as quais o consumo de drogas pela juventude vem sendo enfrentado, seja sob a ótica da pesquisa, seja sob a ótica das respostas sociais e públicas. As seguintes considerações dispostas ao longo de quatro capítulos são emblemáticas para o encaminhamento da proposta final, presente no quinto e último capítulo: 1) o consumo de drogas pelos jovens, manifestação contemporânea das adversidades que os cercam, merece ser compreendido na sua complexidade e enfrentado para além de sua manifestação fenomênica; 2) cabe ao campo da Saúde Coletiva e, como tal, à Enfermagem em Saúde Coletiva, subsidiar o encaminhamento de políticas e práticas sociais e públicas destinadas a apoiar e fortalecer a juventude, evidenciando em especial a sua atração/rejeição pelos objetos que permitem prazer imediato, entre eles, as drogas; 3) o consumo de drogas na contemporaneidade tem dimensão estrutural, está inscrito no espetáculo da marcha de expansão do capital e sob os postulados da pós-modernidade, vinculado aos interesses das grandes corporações de drogas lícitas e do narcotráfico; 4) a perspectiva ontológica de valor presente na produção de Georg Lukács, que trata da complexidade do processo de constituição dos sistemas humanos de valoração nas sociedades capitalistas e da relação incondicional entre necessidades e valores sociais na formulação de respostas aos desafios da existência humana, possibilita reconhecer que uma crise de valores aludida por Marilena Chauí como crise de valores morais sustentaria o eixo central e mediador da aproximação/distanciamento dos jovens ao mundo das drogas na contemporaneidade; 5) a categoria juventude, reordenada sob os conceitos de classe social, de geração e de conflito geracional por Marialice Foracchi, permite compreender os jovens das diferentes classes como sujeitos históricos e suas potencialidades para oferecer respostas coletivas diferentes daquelas formatadas pelos padrões dominantes do espetáculo; 6) o uso/desuso de drogas, lícitas ou ilícitas, tem caráter social e se expressa desigualmente no interior da juventude: sob a reestruturação produtiva, as juventudes brasileiras têm desiguais e diversas condições de acesso ao trabalho, à educação e aos bens socialmente produzidos, da mesma forma reagindo desigual e diversamente no interior do processo de descontinuidade geracional às inseguranças, à ordem instituída pelo mundo adulto, aos estímulos ao prazer imediato; 7) embora as políticas e práticas sociais públicas em nosso país, especialmente a partir da Constituição de 1988, tenham progressivamente incluído a juventude como um de seus focos de atenção presente aí também o campo da saúde os resultados não ultrapassam os limites do uso das noções de risco ou de fator de risco, especialmente revisitadas pelo projeto da nova saúde pública ao circunscrever o objeto de estudo/intervenção; 8) o campo da Saúde Coletiva, na distinção que mantém com os pressupostos e as diretrizes da nova saúde pública, se contrapõe ao modelo hegemônico de intervenção estrutural sobre o problema o da guerra às drogas mas também encaminha reservas em relação ao adotado modelo de redução de danos, oferecendo-se como baliza para produzir ações educativas de caráter emancipatório; 9) partindo da compreensão da natureza social dos fenômenos da saúde e da doença e, portanto, da relevância de se intervir sobre o plano dos determinantes e dos resultados, a Saúde Coletiva apela para que se considere a juventude na sua historicidade, na sua potencialidade para a realização de práxis sociais criativas e na possibilidade de que, estimulados por metodologias apropriadas, os jovens das diferentes classes sociais expressem os valores e necessidades que apoiam suas respostas aos desafios que os cercam, núcleos fundamentais para a construção de seu fortalecimento e de estratégias de superação dos problemas que os perturbam; 10) sob o eixo da instrumentalização da inteligência popular e ancorada pela contribuição da pedagogia histórico-crítica proposta por Dermeval Saviani, uma proposta educativa de caráter emancipatório poderá levar os jovens a se apropriar do entendimento das raízes que suportam o consumo de drogas, potencializando sua capacidade de aglutinação no encaminhamento de soluções coletivas. Munidos por tais considerações, que colocam em debate a complexidade do problema tratado, direcionados pela análise de Richard Sennett acerca da cultura no novo capitalismo, apresentamos as bases de um projeto de pesquisa em desenvolvimento cujo objetivo é o de sistematizar um arcabouço teórico-metodológico e operacional para intervenção junto a jovens, baseado nos valores sociais e relativos ao consumo de drogas em diferentes classes sociais, com a finalidade de alicerçar o desenvolvimento de políticas públicas que levem a estruturar práticas de intervenção não apenas voltadas ao desgaste da juventude, mas, sobretudo ao seu fortalecimento. Advoga-se o desenvolvimento de uma educação emancipatória para a constituição de uma cultura de resistência, forjada a partir do questionamento dos valores dominantes, do acolhimento de manifestações de descontentamento e do desenvolvimento de valores de compromisso e responsabilidade que posicionem os jovens na condição de sujeitos ético-políticos, incentivando a participação política e a solidariedade social.
ABNT:
SOARES, Cássia Baldini. Consumo contemporâneo de drogas e juventude: a construção do objeto na perspectiva da saúde coletiva. 2007.Universidade de São Paulo, São Paulo, 2007. Disponível em: < http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/livredocencia/7/tde-26112007-161151/ >.