TGI
Metrópole, cotidiano e racismo: morte e encarceramento da população negra em São Paulo
Autor(a):
Santos, Guilherme Estevão dos
Orientador(a):
Alfredo, Anselmo
Ano de publicação:
2017
Unidade USP:
Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas [FFLCH]
Palavras-chave do autor:
racismo; metrópole; cotidiano; crise; concorrência
Resumo:
No último quarto do século XX em meio a transformações significativas do capitalismo mundial, como por exemplo o fim do modelo de produção fordista, a crise do petróleo e sobretudo a transformação do capitalismo industrial em capitalismo financeiro, sucedeu-se, sobretudo, na periferia do capital (países de terceiro mundo ou subdesenvolvidos) a industrialização e modernização do campo, que teve como fundamento a mecanização dos processos produtivos e redução significativa do trabalho vivo na produção agrícola, tal processo tem como consequência um significativo êxodo rural do campo para a cidade, onde a forma de consciência do homem do campo também se transforma, pois é marca desta o processo a massificação e padronização do consumo, agora enquanto símbolo de uma identidade urbana (Mandel, 1978) transformando e intensificando a metrópole enquanto aglutinação, acumulação, centralização, concentração dos processos críticos de valorização, dos fatores de produção, sobretudo da força de trabalho (Damiani, 2009) avivando nesse sentido os processos concorrenciais inerentes a acumulação capitalista. A concorrência tratada como sociabilidade crítica, assim é definida pois é fruto de uma constante dispensa de trabalho vivo e mecanização de todos os setores produtivos, impossibilitando a capacidade de valorização a partir da mais-valia advinda do trabalho vivo, configurando assim um processo de valorização baseado na ficcionalização do valor, os juros. (Anselmo, 2010). A sociabilidade crítica é interpretada enquanto efetivação deste processo crítico de valorização no cotidiano, se explana no urbano, onde o processo da reprodução crítica do capital escancara suas contradições, onde a sociedade do trabalho se mostra intransponível como forma de consciência, onde a concorrência se acirra de tal forma, que a violência, o cárcere e a morte não mais são estranhados. Nesse sentido ao olharmos para a formação social/racial da sociedade brasileira vamos observar que essa se formou historicamente na base da dominação do sujeito negro para o trabalho e na naturalização desta dominação, ou seja, toda violência sobre a população negra, expressa pela escravidão africana, permaneceu no período pós-abolicionista, se cristalizou e se repõe a cada nova era do capital, assim ocorreu com a formação do mercado de trabalho livre em São Paulo, onde a imigração italiana marginalizou os negros enquanto sub-trabalhadores (Santos, 1998) e ocorre hoje, na era do capitalismo financeiro, marcado pela diminuição dos postos de trabalho, com a violência urbana em São Paulo que mata e encarcera a população negra (Sinhoretto, Silvestre e Schilittler, 2014). A naturalização, racionalização e espetacularização de tal violência muitas vezes perpetrada pelo Estado expõe o caráter concorrencial crítico desta sociabilidade, que não estranha a morte e o cárcere e concebe tal dominação enquanto forma de justiça. Essa dominação funda um novo conjunto de normas sociais que limitam fisicamente o cotidiano do negro na metrópole paulista, desde simples gestos corporais até lugares passiveis ou não de serem frequentados. O negro vive no urbano a objetividade e subjetividade do medo, pois assim como na sociedade escravista, ele é um ser a ser domado.