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Autor(a):

Magalhães, Elisabete Freire

Orientador(a):

Gonçalves Filho, José Moura

Ano de publicação:

2002

Unidade USP:

Instituto de Psicologia [IP]

Assuntos:

psicologia social

Resumo:

O movimento hip hop, um movimento artístico-político nascido em guetos nova-iorquinos e conduzido por jovens pobres, pretos e latinos, no início da década de setenta, foi assumido também no Brasil, sobretudo por jovens também das classes pobres, em São Paulo, Campinas, Brasília, Rio de Janeiro, Curitiba, Porto Alegre, Recife e outros centros urbanos, a partir do final da década de oitenta. Sustentado por jovens marcados pela discriminação social e racial, o movimento hip hop vale como resposta à exclusão social, à espoliação e impedimentos econômico-culturais, vale como resposta à opressão e humilhação públicas. O movimento hip hop apoia-se sobre dança, desenhos em muros e paredes e canções ritmadas: o break, o tag ou grafite e o rap. As três formas expressivas são formas de protesto contra o sistema - o capitalismo, o poder classista e burguês, o consumismo e a mídia. Nossa questão: quem é o rapper brasileiro? Inserimo-nos no campo de investigações de uma psicologia do oprimido e nosso objetivo foi caracterizar e discutir a identidade do rapper. Da audição variada e diligente de raps, de encontros preliminares com rappers militantes e expoentes do movimento hip hop no Brasil, de anotações em diário de campo, dedicamo-nos à elaboração de um roteiro para entrevistas de longa duração que reclamassem largamente a memória e o trabalho da memória dos depoentes. Elegemos para a discussão da identidade-rapper o depoimento da rapper Dina Dee, por comportar o que designamos como densidade biográfica. Estabelecemos e discutimos cinco categorias identitárias, todas apoiadas em seu depoimento: pobre, religiosa, forte, pensadora, artista, mulher. Dina Dee é pobre: vive experiências de escassez, espoliação, impedimento de bens materiais e culturais; e vive a experiência da humilhação pública. ) A rapper é religiosa: vive a experiência de Deus como afirmação de um mundo que acolhe e abençoa os pobres, veta a entrada dos ricos e soberbos; seu encontro com o rap é amiúde pensado como um processo de conversão e afirmação de fé; o rap abraça, sustenta o pobre, confirma a dignidade humana dos pobres. A rapper é forte: resiste aos apelos da revolta cega, quando responde à injustiça e violência sofridas por ela e seus irmãos de classe; muitos amigos não agüentaram, partiram para o crime (tráfico, roubo, estelionato ; estão mortos ou presos), muitos encontraram no alcoolismo e na drogadição a saída para a subjetividade refreada; a rapper quer penetrar e atravessar a realidade, sem embriagar-se pelo ódio e tampouco sem ser tomada por excesso de auto-piedade. A rapper é pensadora: narra e discute seu cotidiano e o cotidiano dos pobres, quer vislumbrar saídas mais permanentes, que lhes possibilitem o direito à vida, à arte e à cidade; conhece, examina, acolhe e reprova a revolta que compele o bandido. Dina Dee é artista: trabalha formas rítmicas e letras, busca beleza e mensagem, interpela-nos com contundência e comove; que ultrapassar o pouco contato escolar com a palavra, procura ler e estudar para rimar; teve também pouca instrução musical, mas toca violão e tem noção de batida: conhece construções rítmicas intuitivamente e por exercício livre; opõe-se à cultura para massas, não toma raps como mercadoria, quer passar mensagem, não canta para ganhar dinheiro. Dina Dee é mulher: no movimento hip hop eminentemente masculino, Dina Dee assume sem medo, sem retraimento, posições corajosas e originais contra o machismo; quando protesta contra o sistema, é como mulher que o faz; a postura viril - tem a voz grossa, veste roupas unissex, canta para dez mil pessoas, dá conselhos a marmanjos - carrega ao mesmo tempo traços de uma mulher meiga, vaidosa, mãe, esposa; ) a rapper que adora ser mulher, combina vigor e delicadeza. Nesta dissertação de mestrado, compartilhamos do pensamento dos seguintes autores principais: Alfredo Bosi, Antonio da Costa Ciampa, Carlos Calado, Donald Woods Winnicott, Ecléa Bosi, Elaine Nunes de Andrade, Erton Moraes, Ferréz, Gilberto Safra, Hannah Arendt, Helena Wendel Abramo, José Carlos Sebe Bom Meihy, José Leon Crochík, José Moura Gonçalves Filho, Jurandir Freire Costa, Maria Isaura Pereira de Queiroz, Maria Luíza Sadoval Schmidt, Max Horkheimer, Milton Santos, Miriam Abramovay, Silvia Cristina de Oliveira, Silvio Essinger, Simone Wei1, Spensy Pimentel, Theodor Adorno, Waldenyr Caldas, Walter Benjamin. E dos seguintes autores rappers: Dina Dee, Edi Rock, Gláucio, Gog,Ka, Loo, Mano Brown, Rúbia, Thaíde, Xandão, dentre outros.

ABNT:

MAGALHÃES, Elisabete Freire; GONÇALVES FILHO, José Moura. Rappers: artistas de um mundo que não existe: um estudo psicossocial de identidade a partir de depoimentos. 2002.Universidade de São Paulo, São Paulo, 2002.